4.2.07

Crescimento (falta de) - "subversão paroquial da justiça"

A coluna de Elio Gaspari, na Folha de São Paulo de hoje, comenta os resultados de uma pesquisa realizada na USP, que contesta a noção de que a justiça no Brasil tende a favorecer "a parte mais fraca".

"Incerteza jurisdicional"

Num trabalho publicado em 2003, Pérsio Arida, Edmar Bacha e André Lara Resende sugeriram a existência de uma 'incerteza jurisdicional' no Brasil - um viés dos juízes, que buscariam promover a justiça social em litígios relacionados com o crédito e o respeito aos contratos. A teoria baseou-se em pesquisa de Bolivar Lamounier, que mostrou que 61% dos juízes entrevistados preferiam decidir a favor dos "fracos".

Em outra pesquisa, realizada por Armando Castellar, com uma amostra de 741 magistrados, 55,4% dos entrevistados afirmaram que a justiça social deve prevalecer nos casos relacionados com a defesa do consumidor e 45,8% afirmaram o mesmo com relação aos contratos trabalhistas.

Esta 'incerteza jurisdicional' inibiria a oferta de crédito e o funcionamento dos mercados no Brasil.


"Subversão paroquial da justiça"

Ivan César Ribeiro e Brisa Lopes de Mello Ferrão, da Universidade de São Paulo, estudaram amostras de 181 decisões judiciais de São Paulo e outras 84 de 16 Estados.

Esta pesquisa mostrou que:
  • "Uma parte com poder econômico ou político tem entre 34% e 41% mais chances de que um contrato que lhe é favorável seja mantido pela justiça do que uma parte sem poder".
  • "Uma parte com poder apenas local tem 38% mais chances de que uma cláusula contratual seja mantida e entre 26% e 38% mais chances de ser favorecido pela justiça do que uma grande empresa nacional ou multinacional".
  • "Quanto maior a desigualdade social num estado, maior é a probabilidade de que uma cláusula contratual não seja mantida pelo judiciário. Passando-se, por exemplo, do grau de desigualdade de Alagoas (coeficiente de Gini de 0,69) para o de Santa Catarina (coeficiente de Gini de 0,56), tem-se uma chance 210% maior de que o contrato seja mantido".

Os autores concluíram que:

  • No Brasil, "a operação das instituições legais, políticas e regulatórias é subvertida pelos ricos e politicamente influentes em seu próprio benefício", uma situação que Edward Glaeser, José Scheinkman, David Laibson e Christine Soutter designaram como "redistribuição do tipo King John" (em oposição à "redistribuição do tipo Robin Hood").
  • "O exercício do poder local promove a 'subversão paroquial da justiça' e, assim, impede o desenvolvimento, especialmente nas áreas de maior desigualdade social. A 'subversão paroquial da justiça' também ajuda a aumentar essa desigualdade, em um círculo vicioso perverso para os mais pobres".

Links

Abaixo os links para os trabalhos de Ribeiro e Ferrão:

Brisa Lopes de Mello Ferrão e Ivan César Ribeiro. Os Juízes Brasileiros Favorecem a Parte Mais Fraca?

Ivan César Ribeiro. Robin Hood Versus King John: Como os Juízes Locais Decidem Casos no Brasil?