29.11.20

Fim do "milagre" chinês?

A meta estabelecida pelo governo chinês de dobrar o PIB do país, nos próximos 15 anos, ou seja, manter, neste período, uma taxa média de crescimento do PIB de 4,7% a.a., dificilmente será alcançada.

Os principais obstáculos para isso, conforme argumenta Michael Pettis, neste artigo, são o declínio, em termos absolutos, da população em idade ativa, a tendência à redução da taxa de crescimento da produtividade do trabalho e o alto nível de endividamento do país (relação dívida/PIB de 280%, em 2020).

22.9.20

Evolução do resultado fiscal primário do governo no Brasil entre 2002 e 2019

Abaixo extrato da análise da evolução do resultado fiscal no Brasil, entre 2002 e 2019, na coluna de Samuel Pessoa - Folha de São Paulo, 20/09/2020:

“[O superávit fiscal tem três componentes]. A componente estrutural do superávit das contas públicas é aquela sustentável a longo prazo. A cíclica está associada ao ciclo econômico e, portanto, na média, é nula. A componente não recorrente é resultado de receitas de privatização ou de leilão de blocos de petróleo.

Entre 2006 e 2014, houve, no Brasil, permanente queda da componente estrutural do superávit das contas públicas. O déficit e, portanto, a dívida pública não se elevaram até 2013, pois a componente cíclica e a não recorrente compensaram a queda da componente estrutural do superávit primário.

Após o pico de 3,9% do PIB, em 2005, o superávit estrutural cai para 2,42% em 2006, fica negativo em 2010, atinge -2,15% do PIB em 2013 e incríveis -4,5% do PIB em 2014.

A variação do superávit primário estrutural entre dois anos, em pontos percentuais do PIB, é o impulso fiscal, uma medida do impacto da política fiscal sobre a demanda. Entre 2006 e 2014, tivemos continuamente impulso fiscal positivo, o que contribuiu para a pressão inflacionária permanente e, portanto, para a necessidade de o BC praticar juros elevados.

A política fiscal mais conservadora dos últimos anos tem surtido efeito e a componente estrutural do déficit público tem se reduzido”. 

15.9.20

Por que o Ocidente ficou rico (e esquisito)

"How Westerners Became Psychologically Peculiar and Particularly Prosperous”, novo livro de Joseph Henrich, foi objeto de resenhas por Daniel Dennett, em The New York Times, e Judith Shulevitz, em The Atlantic.

A principal tese do livro é que a proibição de casamentos entre primos, no século VI, progressivamente  estendida até incluir primos de sexto grau, entre outras interdições estabelecidas pelo que viria a se tornar a Igreja Católica Romana, levou ao enfraquecimento dos laços de parentesco, ou seja das famílias, tribos e clãs, e, portanto, promoveu o individualismo e, em última instância, a prosperidade e a democracia no Ocidente.

Para uma exposição desse argumento, ver a palestra de Henrich, neste vídeo.

30.8.20

Modelo de desenvolvimento chinês

O PIB da China aumentou 39 vezes, entre 1979, ano em se iniciou o processo de “reforma e abertura” liderado por Deng Xiao Ping, e 2019, de acordo com estimativas publicadas pelo Banco Mundial.

Mathew Klein e Michael Pettis, em seu livro “Trade Wars Are Class Wars”, propõem uma explicação simples e bem conhecida para o “milagre chinês”.

O mecanismo básico por trás do “milagre”, segundo os autores, foi a acentuada compressão da participação da renda do trabalho no PIB, viabilizada pelas notórias restrições às liberdades democráticas e direitos trabalhistas que prevalecem na China.

Salários e benefícios aumentaram em termos absolutos, de modo que houve significativas redução da pobreza e elevação do padrão de vida na China, neste período. Mas esse aumento da renda do trabalho se deu a taxas mais baixas do que a taxa de crescimento do PIB, com a consequente redução da participação do trabalho na renda total.  

Como contrapartida disso, embora também tenha se expandido significativamente, em termos absolutos, o consumo das famílias, segundo Klein e Pettis, se reduziu como proporção do PIB em 15 pontos percentuais, entre o final da década de 1980 e 2010, e ainda equivalia a apenas 40% do PIB, em 2018.

A contenção do consumo das famílias liberou recursos para financiar investimentos massivos (privados e públicos) em capital físico, além de um superávit também expressivo na conta corrente do balanço de pagamentos.

Outra maneira de descrever o mesmo mecanismo seria dizer que a compressão relativa da renda do trabalho levou a um aumento da concentração da renda pessoal na China, o que, por sua vez, aumentou a taxa de poupança e a taxa de investimento (interno e externo). Com efeito, o coeficiente de Gini chinês, que era de pouco mais de 30 pontos, em 1981, chegou a 49 pontos, em 2008, e declinou ligeiramente, a partir daí, alcançando recentemente 46 pontos,  enquanto a taxa de poupança, se situou em 34%, em 1981, 50%, em 2008, e 45%, em 2018.

Nada de novo sob o sol, tendo em vista que este mix de ditadura, concentração de renda e rápida acumulação de capital é também a explicação frequentemente proposta para processos anteriores de crescimento econômico acelerado, como o “milagre brasileiro”, entre 1968 e 1973.

18.8.20

Clubes de convergência - de qual clube o Brasil é sócio?

Que países emergentes, dado o crescimento do produto por trabalhador que apresentaram, no período 1970 - 2018, devem se juntar, no longo prazo, ao grupo de países desenvolvidos? 

Esta pergunta é respondida no relatório Global Productivity –Trends, Drivers and Policies, recém-publicado pelo Banco Mundial. 

Um exercício utilizando dados para 98 países e a metodologia de clubes de convergência identificou 16 países emergentes em trânsito para o clube de países ricos:

. 2 países da América Latina: Chile e Panamá

. 5 países europeus, todos ex-comunistas: Albânia, Bulgária, Romênia, Hungria e Polônia

. 2 países do Oriente Médio: Turquia e Iraque

. 2 países do Sul da Ásia: Índia e Sri Lanka

. 5 países do Sudeste Asiático: China, Vietnam, Tailândia, Mianmar e Malásia

Estas 16 economias emergentes com maior probabilidade de se incorporar ao grupo de economias desenvolvidas se caracterizam, em geral, por níveis iniciais de educação mais elevados, por governos mais efetivos, de acordo com os Indicadores Internacionais de Governança do Banco Mundial, e por maior complexidade, medida pelo índice de Hausmann-Hidalgo, relativamente às demais economias não desenvolvidas.

O Brasil integra um segundo clube de convergência, formado por 31 países, dentre eles Argentina, México, Angola, Moçambique, África do Sul, Nigéria, Marrocos, Argélia, Egito, Irã, Bangladesh, Indonésia e Filipinas.

Três outros clubes de convergência, de acordo com os resultados deste exercício, reúnem 21 países em que a produtividade do trabalho tende a permanecer muito baixa.

Os clubes de convergência identificados não implicam  necessariamente eliminação completa das diferenças no nível de produto por trabalhador entre os países que os integram, o que seria, segundo os autores do relatório, uma condição muio estrita, que não é satisfeita nem pelas economias classificadas atualmente como desenvolvidas. Entretanto, tal como aconteceu com as economias desenvolvidas nos últimos 50 anos, se pode esperar, em cada clube de convergência, uma redução considerável das diferenças de produtividade, ao longo do tempo, com apenas diferenças menores, ainda que persistentes, tendendo a subsistir.

4.8.20

Comparação entre os PIBs dos Estados Unidos e China

Na postagem anterior, se mostrou que o PIB da China, quando convertido em dólares pela taxa de câmbio que confere ao dólar o mesmo poder de compra nos Estados Unidos e na China (taxa de câmbio PPP), era praticamente idêntico ao PIB americano, em 2017.

Quando, porém, a conversão em dólares é feita pela taxa de câmbio de mercado, o PIB americano superava em 60% o PIB chinês, naquele ano.

Qual dessas medidas é a mais apropriada para comparar as duas economias depende do objetivo da comparação, como mostra Jeffrey Frankel, neste artigo publicado pelo Project Syndicate.

(Versão em português aqui)

25.7.20

Programa de Comparação Internacional 2017

Abaixo informações extraídas dos resultados, recentemente divulgados, do International Comparison Program 2017, projeto do Banco Mundial que tem por objetivo coletar dados sobre preços e despesas e calcular paridades do poder de compra, com base nas quais estimativas comparáveis do PIB para as diferentes economias nacionais (176 países, no caso do ICP 2017) são derivadas.

O valor do PIB mundial em 2017 foi de 119,5 trilhões de dólares.

O valor dos PIBs da China e Estados Unidos era praticamente idêntico (19,5 trilhões de dólares), naquele ano, com os dois países respondendo, juntos, por um terço do PIB mundial.

. O valor do PIB per capita mundial foi de 16.596 dólares, em 2017.

O PIB do Brasil foi estimado em 3 trilhões de dólares.

. O PIB per capita brasileiro, no valor de 14.520 dólares, era ligeiramente superior ao PIB per capita chinês (14.150 dólares) e equivalente a 87,5% do PIB per capital mundial e a 24,2% do PIB per capita dos Estados Unidos.

. O nível de preços no Brasil correspondia a 68,4% do nível de preços nos Estados Unidos.

26.5.20

Efeitos macroeconômicos da redução do poder de barganha dos trabalhadores

O declínio do poder de barganha dos trabalhadores foi possivelmente a mais importante mudança estrutural ocorrida na economia americana, nas últimas quatro décadas, e oferece uma explicação unificada para diversos fenômenos observados neste período, como a estagnação dos salários, a redução da participação do fator trabalho na renda, o aumento dos mark ups, da lucratividade média das empresas e do Q de Tobin e a queda da inflação e do desemprego. Este é o argumento apresentado em Working Paper da NBER, de autoria de Ana Stansbury e Lawrence Summer, publicado nesta semana.

3.5.20

Escola Austríaca

Resenha do livro “The Long Shadow of the Austrian School”, por Edward Chancellor, publicada na New York Review of Books, pode ser lida aquiA “Escola Austríaca”, no livro, inclui não apenas os suspeitos habituais Hayek e von Mises, mas também Menger, Bohm-Bawerk, Schumpeter, Harberler. Gerschenkron e Morgenstern.

27.4.20

Como reduzir o impacto dos gastos com a pandemia sobre a dívida pública

Uma alternativa ao financiamento direto pelo Banco Central dos gastos do Tesouro com a pandemia do COVID-19, envolvendo redução da taxa SELIC, venda de uma fração das reservas internacionais e a autorização para o Banco Central receber depósitos voluntários remunerados das instituições financeiras, é sugerida por Ailton Braga, neste artigo publicado no Valor – edição de 24 de abril.

12.4.20

Dinheiro de helicóptero - porque, no Brasil, não

Argumentos contrários ao financiamento do Tesouro pelo Banco Central, pelo menos no caso do Brasil, apresentados por Márcio Garcia e Marcos Mendes, na Folha de São Paulo, e por Eduardo Zilberman, no Valor.

22.3.20

Como enfrentar a crise econômica do COVID 19

Richard Baldwin e Beatrice di Mauro organizaram este e-book, publicado pelo CEPR e Vox-EU, com contribuições de Charles Wyplosz, Gita Gopinath, Olivier Blanchard, Alberto Alesina, Jordi Gali e outros economistas eminentes, sobre como enfrentar a crise econômica causada pela pandemia do COVID 19.

3.3.20

Demografia e crescimento econômico

Demografia não é destino, mas, de acordo com David Bloom, professor de economia e demografia na Universidade Harvard, determina muitas das oportunidades e desafios com que as sociedades se defrontam. Os efeitos das mudanças em curso, mundo afora, nas taxas de crescimento demográfico, de fecundidade e mortalidade e na estrutura etária da população são analisados por ele, neste artigo publicado em Finance & Development.

7.1.20

A política monetária no século XXI, segundo Bernanke

Em seu discurso presidencial, na reunião anual da American Economic Association, Ben Bernanke analisou o que seria a “política monetária do século XXI”, com foco na questão de como preservar a eficácia da política monetária, quando a taxa de juros nominal alcança o seu piso de 0%.

Se a taxa de juros nominal neutra, nos Estados Unidos, se situar no intervalo de 2% – 3%, como parece ser o caso, uma combinação de afrouxamento quantitativo e orientação futura seria suficiente, segundo Bernanke, para compensar a restrição à política monetária imposta pelo piso de 0% da taxa de juros nominal (ZLB). 

Se a taxa de juros nominal neutra for inferior a 2%, a par da utilização daqueles dois instrumentos de política, seriam também necessários um aumento da meta de inflação dos atuais 2% para 4% - 5% e uma expansão fiscal, para manter a taxa de inflação em torno da meta e a taxa de desemprego em torno da taxa natural, quando a economia estiver no ZLB.

P.S. Para uma visão mais cética com relação à potência da política monetária, no contexto atual das economias desenvolvidas, ver The Economist - edição de 11/01/2020.