29.12.06

Desigualdade de oportunidades no Brasil

Na edição de hoje do Valor Econômico, Naércio Menezes discute a relação entre desigualdade de renda e desigualdade de oportunidades no Brasil. Abaixo são reproduzidos os principais pontos do artigo.

  • "A desigualdade de renda brasileira parece refletir muito mais uma desigualdade de oportunidades do que uma desigualdade de talentos ou de esforços".
  • "Por algum tempo, disseminou-se a idéia de que o Brasil é um país com alta mobilidade entre as gerações. Os estudos que chegaram a essa conclusão verificaram que as gerações mais novas, geralmente nascidas após o milagre econômico, alcançaram posições ocupacionais melhores do que as atingidas pelos seus pais".
  • "Entretanto, a mobilidade deve ser medida por quanto a posição dos pais na distribuição de renda da sua geração determina a posição dos filhos na distribuição de renda atual. Estudos recentes mostram que o Brasil, na verdade, é um dos países com menor mobilidade intergeracional entre os que possuem dados disponíveis para este tipo de análise. A correlação entre a posição relativa dos pais e a dos filhos na distribuição de renda é de 0,60 no Brasil, comparada com 0,40 nos EUA, 0,23 no Canadá, 0,34 na Alemanha e 0,20 na Suécia".

Estudo de caso para alunos de microeconomia - o peso morto do Natal (I)

James Surowiecki publica quinzenalmente na New Yorker uma coluna sobre economia - The Financial Page. Na edição da revista datada de 25 de dezembro, a coluna traz uma resenha do que a teoria econômica tem a dizer sobre o hábtio de trocar presentes. A principal conclusão é que somos muito ineficientes ao presentear. Algumas recomendações sobre como reduzir esta ineficiência e, assim, aumentar o bem estar social são oferecidas.

20.12.06

Crescimento (falta de) - investimento em transportes

Conforme mostram os dados abaixo, os investimentos da União em transportes como proporção do PIB corresponderam, na última década, a apenas um décimo do seu valor em 1970.

Investimento da União em transportes como % do PIB

1975 - 1,84
1980 - 1,1
1985 - 0,68
1990 - 0,4
1995 - 0,16
2000 - 0,2
2003 - 0,16
2004 - 0,1
2005 - 0,13
2006 - 0,19 (estimado)

Fonte: Valor Econômico, 20/12/2006.

17.12.06

Crescimento (falta de) - porque 25%

Nas duas postagens anteriores sobre os entraves ao crescimento econômico no Brasil, uma taxa de investimento de 25% foi mencionada como condição necessária para se obter um crescimento do PIB de 5% ao ano. Uma maneira de chegar a esse número é utilizar o chamado modelo de crescimento AK.
De acordo com esse modelo, a taxa de crescimento do PIB de uma economia é dada por Ŷ = s A - d, onde Ŷ = taxa de crescimento, s = taxa de investimento, A = relação produto-capital (Y/K) e d = taxa de depreciação.
A produtividade do capital (A) na economia brasileira é frequentemente estimada em 0,33. Supondo que a depreciação do capital fixo corresponde a 10% do PIB e dado o valor suposto para A, a taxa de depreciação seria 3,3%*. Substituindo-se Ŷ = 0,05, A = 0,33 e d = 0,033 na expressão para a taxa de crescimento, obtém-se s = 0,25.

* d = (D / Y) (Y / K), onde D = depreciação total.

Crescimento (falta de) - o programa de Scheinkman

Condições para um crescimento do PIB de 5% ao ano, segundo José Alexandre Scheinkman, na edição de hoje da Folha de São Paulo:

(1) Aumento da taxa de investimento. "Um pré-requisito importante para crescer a 5% ao ano de maneira sustentada seria que a taxa de investimento, hoje em torno de 20%, chegasse a 25% do PIB".

(2) Reforma tributária. "O Brasil precisa de uma reforma tributária que substitua os impostos indiretos sobre bens, serviços e trabalho (ICMS, IPI, ISS, Cofins etc.) por um imposto sobre o valor adicionado. Para combater a informalidade, a reforma deveria reduzir a contribuição previdenciária paga pelos trabalhadores com menores salários. Também deveria reduzir gradualmente a CPMF até atingir 0,08% em julho de 2010".

(3) Redução de impostos. "É preciso também reduzir a carga tributária, que não só supera a de outros países com o nosso nível de desenvolvimento, mas também a de países muito mais ricos, como Coréia do Sul ou Estados Unidos".

(4) Investimento em infraestrutura. "Estudos econométricos documentam que uma das razões para o mau desempenho da economia brasileira a partir da década de 80 foi a falta de investimentos em infra-estrutura. A privatização dos anos 90 ajudou em setores como a telefonia, mas a ausência de regulamentação adequada para setores cruciais, como o de geração de eletricidade, e o nível quase nulo de investimentos do governo federal resultam em um déficit em infra-estrutura".

(5) Corte dos gastos correntes do governo. "Diminuir a carga tributária enquanto se aumenta o investimento público requer corte nos gastos correntes do governo, o que não deveria ser difícil em um país em que os três níveis de governo se apropriam de quase um terço do PIB".

16.12.06

"Filósofos" x "Práticos"

David Card, professor da Universidade da Califórnia - Berkeley e ganhador da Medalha John Bates Clark - 1997, em uma entrevista para The Region - a revista da seção de Minneapolis do Federal Reserve Bank -, tem um entendimento similar ao de Mankiw quanto a como classificar os economistas. Com alguma edição, eis sua interpretação:
"Economics as a whole is really a combination of two kinds of people: those who are very practically oriented and those who are more like mathematical philosophers. The mathematical philosophers get most of the attention. They deal with the big unanswerable questions. The practically oriented economists try to be more scientific: looking for very specific predictions and trying to test these as carefully as possible. The mathematical philosophers get very frustrated by the practical economists. They come up with a broad general theory, and we tell them it doesn't fit the evidence. Practical economists need to know the basic nuts and bolts of our field. That's why we get paid reasonably well. On average, philosophers don't get paid much".

Novos Clássisos x Novos Keynesianos

Greg Mankiw discute a evolução da teoria macroeconômica, desde a publicação da Teoria Geral de Keynes até hoje, num provocativo artigo publicado no Journal of Economic Perspectives.

Os dois principais pontos defendidos por Mankiw neste artigo são:

(1) A divisão dos economistas entre novos clássicos e novos keynesianos não corresponde, no essencial, à divisão política entre direita e esquerda. Numa larga medida, é um cisma entre "cientistas puros" e "engenheiros econômicos". A evidência disso é que tanto Clinton como Bush empregaram economistas novos keynesianos (Fischer, Summers, Stiglitz, Yellen, Bernanke, Mankiw, Taylor) em postos-chave dos respectivos governos, enquanto as lideranças intelectuais dos economistas novos clássicos (Lucas e Prescott, por exemplo) nunca saíram da academia.

(2) Tanto a pesquisa novo-clássica como a novo-keynesina tiveram pouco impacto sobre os macroeconomistas práticos, encarregados da condução das políticas monetária e fiscal, assim como sobre o que é ensinado a respeito de política econômica nos cursos de graduação em economia. Esta pesquisa pode ter sido bem sucedida do ponto de vista "científico" mas não contribuiu significativamente para a "engenharia macroeconômica".

15.12.06

Estudo de caso para alunos de microeconomia - licenças individuais de poluição

Mercados de licenças de poluição para empresas (uma solução "de mercado", alternativa à regulação, para este tipo de externalidade negativa) já existem em alguns países. Segundo notícia publicada no Valor Econômico de hoje, o Reino Unido quer dar um passo além.
"O Reino Unido estuda a adoção de um cartão de crédito de poluição. O sistema calcula a emissão de CO2 por pessoa em cada viagem de avião e ônibus ou por litro de combustível usado no carro. Assim, o consumidor teria uma cota para compra de passagens ou de gasolina. Terminada essa cota, ele teria de comprar o direito de uso de outra pessoa que ainda tenha créditos disponíveis. A cota seria renovada anualmente. A proposta seria criar contas, como as bancárias, com cartões com chips para controlá-las".
Quais os efeitos dessa medida, segundo o Teorema de Coase?

14.12.06

Crescimento (falta de) - investimento ou produtividade? (I)

Ailton Braga argumenta, na edição de hoje do Valor Econômico, que a queda da taxa de crescimento de longo prazo no Brasil está relacionada com uma grande redução na taxa de investimento, ocorrida a partir de 1981:

"Observando-se a série de investimentos em relação ao PIB, a preços de 2005, desde 1970, é possível identificar a principal causa do baixo crescimento da economia brasileira desde a década de 1980: a forte redução da taxa de investimentos. Na década de 1970, período de forte expansão do PIB, os investimentos, a preços de 2005, situaram-se entre 29,7% e 36,6% do PIB. A partir de 1981, os investimentos em relação ao PIB declinaram rapidamente e desde 1999 variaram entre 19% e 21,5%, os níveis mais baixos do período em análise. Na China, a taxa de investimentos, em 2004, foi de 38,7% do PIB e na Índia, 30,1%.
Em trabalho de 2005, Edmar Bacha e Regis Bonelli, estimaram que para uma taxa de investimento de 19% do PIB, o estoque de capital cresceria 2,1% ao ano, o que seria compatível com crescimento anual do PIB de 2,1% a 3,2%. De 2003 a 2006, considerando-se para 2006 a estimativa do boletim Focus, o PIB teve crescimento médio de 2,7% ao ano, portanto, dentro do intervalo estimado por Bacha e Bonelli. Utilizando a mesma metodologia desenvolvida pelos dois autores, expansão do PIB de 4% a 4,5% ao ano exigiria taxa de investimentos de cerca de 25%".

Um trabalho recente oferece outra explicação para a redução da taxa de crescimento de longo prazo da economia brasileira. Em sua análise das "décadas perdidas" no Brasil, Flávia Graminho, economista do Banco Central do Brasil, sugere que o baixo crescimento nos anos 80 se deveu a um choque de produtividade negativo, relacionado com o fechamento da economia que se seguiu ao aumento dos preços do petróleo e à crise da dívida externa. As restrições à importação teriam levado à redução da competição e à substituição de máquinas e equipamentos importados por similares nacionais de menor eficiência, reduzindo a produtividade total dos fatores. Nos anos 90, com a abertura comercial, a produtividade total cresceu a taxas semelhantes às da década de 70, de modo que o baixo crescimento deve ter tido outra motivação. De acordo com a autora, uma explicação possível seria o aumento do custo do trabalho, associado com as "distorções" no mercado de trabalho introduzidas ou ampliadas pela Constituição de 1988.

Insignificância tem alternativa

Se sua regressão produziu apenas coeficientes estatisticamente não significativos, seguir torturando os dados não é mais a única alternativa. Segundo matéria do New York Times, um novo periódico da área de ciências sociais - o Journal of Spurious Correlations - foi lançado com a finalidade de publicar exclusivamente resultados negativos, ou seja, exercícios em que a hipótese nula não é rejeitada.
Os editores justificam a criação do JSC com dois argumentos.
Primeiro, a publicação de resultados negativos evita que outros pesquisadores gastem tempo e recursos financeiros repetindo os mesmos estudos. Em segundo lugar, se, de dez pesquisas sobre um tema qualquer, apenas uma - aquela em que a nula não foi rejeitada - é publicada, um survey da literatura sugeriria uma correlação entre as variáveis envolvidas que, na verdade, com grande probabilidade não existe.
A disseminada política editorial de só acolher resultados em que há rejeição da nula levaria, assim, a viés e desperdício de informação - donde a necessidade do JSC.

Desconcentração espacial da produção (II)

Evidência adicional de desconcentração espacial da produção no Brasil - segundo o IBGE, a participação das capitais de estado no PIB brasileiro se reduziu de 32% para 28%, entre 1999 e 2004, ao mesmo tempo em que os municípios não metropolitanos aumentaram sua participação de 46% para 49%.
Boa parte da "perda" das capitais se explica pelo "encolhimento" de São Paulo, que reduziu sua parcela no PIB brasileiro de 11,6% para 9,1%, nesse período (ver também a esse respeito a nota postada em 11 de dezembro).

13.12.06

Ensino Pago (nos Estados Unidos)

As faculdades (colleges) e universidades americanas adotam uma política de precificação bastante complexa (e curiosa). Como mostra um artigo publicado esta semana no New York Times, o valor da anuidade funciona como um sinal da qualidade da educação oferecida, de modo que, quando a anuidade aumenta, a instituição atrai mais e melhores candidatos. Assim, há um incentivo para que as anuidades sejam nominalmente elevadas. Para viabilizar a matrícula, são, então, oferecidos aos alunos pacotes individuais de ajuda financeira, num sistema que se aproxima da discriminação de preços de primeiro grau.
A anuidade média nas instituições privadas sem fins lucrativos é de 30 367 dólares (incluídos room and board, ou seja, acomodações no campus e alimentação). Embora o ensino seja pago, os estudantes recebem um subsídio bastante substancial. O artigo menciona que, em uma faculdade de elite da Pennsylvania, enquanto o custo anual por aluno é de 73 000 dólares, metade dos estudantes paga o "preço de tabela" de 41 mil dólares e o restante, menos do que isso, com a diferença sendo coberta pela renda originada do patrimônio de 1,3 bilhões de dólares que a faculdade possui.

11.12.06

Desconcentração espacial da produção (I)

De acordo com dados apresentados por Marcos Cintra, na sua coluna da Folha de São Paulo – edição de 11/12/2006, a participação da cidade de São Paulo no PIB brasileiro declinou de 15,8% para 9,44%, entre 1980 e 2003, com o PIB da cidade se reduzindo em termos absolutos de R$ 110,3 bilhões para R$ 107,9 bilhões (a preços de 2000), entre aqueles dois anos. Para Cintra, a “realização das oportunidades não aproveitadas existentes nas demais regiões do país (...) explicaria a queda relativa de São Paulo, jamais seu empobrecimento”. A queda absoluta do PIB indicaria que outros fatores, como a falta de liderança política, também desempenharam um papel nesse processo. Durante o período em questão (1980 / 2003), governaram a cidade Jânio, Erundina, Maluf, Pita e Martha ...

10.12.06

Estudo de caso para alunos de microeconomia - passagens aéreas a 2 reais

Veja – edição de 13/12/2006 descreve a estratégia de precificação adotada pela Ryanair, uma das mais bem sucedidas low fare airlines da Europa:

“A companhia aérea irlandesa Ryanair encontrou uma estratégia radical para revolucionar o competitivo mercado de baixo custo. Suas passagens não são só baratas como as de seus concorrentes. Algumas são praticamente gratuitas. Um trecho entre Londres e Roma custava na semana passada, por exemplo, 0,79 euro (pouco mais de 2 reais); entre Porto e Barcelona, 0,01 euro (0,03 real). Com esses preços, a empresa transformou-se numa das mais populares e lucrativas da aviação mundial. Lucrativas? Sim. A Ryanair deu um novo sentido ao princípio econômico segundo o qual "não existe almoço grátis". Se o passageiro não paga para voar, paga por quase todo o resto. Quer um copo de água? Sem problemas, basta desembolsar 2,50 euros (7,06 reais). Há taxas para despachar bagagens, instrumentos musicais e até para levar crianças a bordo. Quando os aviões estão no ar, os comissários transformam os corredores da aeronave em verdadeiras feiras ao ar livre. Tudo é vendido, desde jogos de cartas até câmeras digitais”.

Nos manuais de microeconomia, esta estratégia de precificação, adotada em muitos setores, é chamada de tarifa em duas partes. Um artigo recentemente publicado no Quarterly Journal of Economics e comentado nesta matéria de The New York Times explica porque tende a não existir competição entre as empresas na fixação de preços dos “acessórios”. Leia a matéria e descubra se você é um consumidor “sofisticado” ou “míope”.

Hayek e Rawls

Brink Lindsey, do Cato Institute, propõe, em artigo publicado em The New Republic, uma fusão entre Hayek e Rawls, uma aliança entre as posições políticas que, nos Estados Unidos, são designadas como “libertárias” e “liberais” . O ensaio merece ser lido, até porque, com as devidas adaptações ao nosso contexto, a formação de uma coalizão como esta é necessária (e talvez possível!) também no Brasil.